quinta-feira, 26 de novembro de 2009

. uma impaciência da alma consigo .


.e assim sou, fútil e sensível, capaz de impulsos violentos e absorventes, maus e bons, nobres e vis, mas
nunca de um sentimento que subsista, nunca de uma emoção que continue, e entre para a substância da
alma. Tudo em mim é a tendência para ser a seguir outra coisa; uma impaciência da alma consigo
mesma, como com uma criança inoportuna; um desassossego sempre crescente e sempre igual. Tudo me
interessa e nada me prende. Atendo a tudo sonhando sempre; fixo os mínimos gestos faciais de com
quem falo, recolho as entoações milimétricas dos seus dizeres expressos; mas ao ouvi-lo, não o escuto,
estou pensando noutra coisa, e o que menos colhi da conversa foi a noção do que nela se disse, da minha
parte ou da parte de com quem falei. Assim, muitas vezes, repito a alguém o que já lhe repeti, perguntolhe
de novo aquilo a que ele já me respondeu; mas posso descrever, em quatro palavras fotográficas, o
semblante muscular com que ele disse o que me não lembra, ou a inclinação de ouvir com os olhos com
que recebeu a narrativa que me não recordava ter-lhe feito. Sou dois, e ambos têm a distância – irmãos
siameses que não estão pegados.

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